Belezura: Saer falando de Drummond

Esse texto foi publicado hoje no blog da editora Cosac Naify e peço licença para reproduzir aqui…

Num de seus brilhantes livros de ensaios, Trabajos (Seix Barral), ainda inédito no Brasil, o escritor argentino Juan José Saer (1937-2005), autor de Ninguém Nada Nunca e A Pesquisa (ambos da Companhia das Letras), fala da grande influência que a poesia de Drummond exerceu sobre os jovens de Buenos Aires nos anos 50 e 60, e se inclui entre os admiradores fervorosos do Mestre de Itabira.

MEUS ANOS EM ITABIRA

Não quero que o leitor pense que pretendo exportar bananas ao Brasil, mas me pareceu que falar da presença da cultura brasileira na Argentina dos anos 50 e 60 seria uma boa forma de entrar no assunto. E nessa presença, ao menos durante esses anos, a figura de Carlos Drummond de Andrade certamente ocupa um lugar central.

É possível que seus vínculos pessoais com a Argentina tenham contribuido um pouco para isso,  já que sua filha, casada com um argentino, vivia em Buenos Aires, o que proporcionava que ele viesse para cá com frequência, dando a muitos poetas jovens, sobretudo aqueles que gravitavam em torno da revista Poesía Buenos Aires, a oportunidade de encontrá-lo.

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O que torna sua poesia tão atraente a ponto de contribuir para a formação de uma nova linguagem poética no Rio de La Plata, é, a meu ver, esse equilíbrio entre espontaneidade e reflexão, entre ironia e desilusão, entre lirismo e rebeldia que a caracteriza.

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Dizem que Matisse (creio) declarou certa vez: “Se Cézanne tem razão, eu tenho razão”. Qualquer jovem poeta argentino da geração dos anos 50 e 60 poderia dizer, do mesmo modo: “Tenho razão porque Drummond, Michaux, Char e cummings têm razão”. Entre eles, o Poema de sete facesSentimento do mundoConfidência do ItabiranoElegia 1938 e Mundo Grande eram verdadeiras contrasenhas, signos de reconhecimento cuja ignorância constituía prova irrefutável de inautenticidade.

Para mim, durante esses anos, a presença de Drummond foi insubstituível, e ainda hoje muitos de seus versos me surgem na memória ainda frescos, com a mesma emoção da primeira leitura, como: “esse amanhecer/mais noite que a noite”, ou o maravilhoso soneto Carta, do livro Lição de coisas, que uns amigos me trouxeram do Rio de presente, em 1962, assim que o livro foi lançado, o que dá uma ideia da familiaridade dos poetas argentinos com sua obra nessa época.

(tradução livre, feita do espanhol, por Daniel Benevides)

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