Presidente das Avós da Praça de Maio encontra neto desaparecido durante ditadura

Foto Gisele Teixeira
Foto Gisele Teixeira
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Ignacio Hurban – Facebook do músico

Hoje me encontraram, muchas gracias a todos!

Esta é a primeira frase de um perfil criado agora à noite em Facebook, por voltasdas 20h, em nome de Ignacio Hurban, o neto recuperado de Estela de Carlotto, presidente da Asociación Abuelas de Plaza de Mayo Ele foi sequestrado ainda bebê, durante a última ditadura militar argentina (1976-1983).

Mais do que um sinal dos tempos, a criação de um perfil (creio que vão surgir outros em nome dele) online atende a uma demanda. Porque somos muitos a comemorar com ele sua nova identidade.

Alegría, alegría, alegría mi corazón!

E também porque é a primeira vez que uma notícia destas é vivida assim, tão intensamente nas redes sociais. Muitas novidades…

Estava a 10 dez quadras da associação das Abuelas fui avisada que tinham encontrado Ignacio, ou Guido para sua família original. Saí correndo pelas ruas para poder estar na entrevista coletiva, que seria em meia hora, mas quase não podia enxergar porque meus olhos estavam mareados. Era a notícia do ano!

Um pouco do clima da coletiva para vocês, gravado no aperto pelo amigo e colega jornalista Ricardo Heinen, que me acompanhou nesta empreitada.

Milico decime qué se siente / Que hayamos encontrado un nieto más / Te juro que aunque pasen los años, siempre los vamos a buscar / Porque ahora somos más, las viejas van a brindar y los pibes con nosotros van a estar

 

 

Sou praticamente vizinha da sede das Abuelas, e isso tem me ajudado a acompanhar de perto os anúncios oficiais dos netos recuperados. Todas as histórias são impressionantes – foram 14 desde que cheguei, em 2008. Mas esta é particularmente simbólica, porque foi a busca deste neto que levou Estela a criar a associação humanitária Abuelas, hoje emblema da luta pelos direitos humanos na Argentina.

Sem a determinação desta mulher, de 83 anos, a história de muitas famílias seria outra, bem mais triste.

Durante a coletiva, uma das coisas que mais me chamou a atenção foi a serenidade de Estela.

“Quando o encontrar, creio que não vou dizer nada. Vou abraçá-lo. Quero tocá-lo, quero ver se é como o sonhamos”. 

“Eu não persigo mais que justiça, verdade, e isso que vivemos hoje, que é o encontro dos netos. Isto é um prêmio para todos. É uma reparação para ele, para a família, e para a sociedade em seu conjunto. É preciso seguir buscando os que faltam”.

Cerca de 30 mil pessoas desapareceram durante a última ditadura argentina, segundo os órgãos de defesa de direitos humanos, e cerca de 500 netos foram afastados de suas famílias biológicas, depois do assassinato de suas mães. O neto de Carlotto é o 114° encontrado pelas Abuelas.

 

Um pouco da história dessa busca

Estela e a filha Laura

Estela e a filha Laura

É de arrepiar. Ignacio procurou a associação voluntariamente, após 37 anos, porque tinha dúvidas sobre sua identidade. Ele é filho de Laura Carlotto, que estava grávida de três meses quando foi sequestrada, em novembro de 1977. Na época, Laura tinha 23 anos e era estudante de história na Universidade Nacional de La Plata e militante da Juventude Universitária Peronista.

Segundo testemunho de sobreviventes, Laura foi mantida com vida no centro clandestino de detenção La Cacha, em La Plata, até dar a luz no Hospital Militar de Buenos Aires, no dia 26 de junho de 1978. Ficou com o bebê apenas cinco horas. Foi executada um mês depois.

A partir deste momento, Estela, que era formada em Magistério e exerceu a profissão por 17 anos, se incorporou ao recém fundado grupo de Abuelas e, dois anos, depois foi nomeada vice-presidente. O movimento não parou de crescer e colher feitos.

Graças à pressão dessas avós, cientistas encontraram um método que permite chegar a um percentual de 99,9% de probabilidade de confirmação genética, mediante análises específicas de sangue. É o chamado “índice de abuelidad”, que ficou famoso no mundo. Isso quando ainda faltava um tempo para que os segredos dos genes e do DNA viessem à tona como agora. Conto um pouco desta história na coluna AS AVÓS CIENTISTAS. 

Hoje, a associação preferiu não dar muitos dados pessoais do neto encontrado. Mas as informações vazaram e já se sabe que Ignacio Hurban foi criado na localidade de Olavarría, tem 36 anos, está casado e é pianista – atualmente diretor da escola de música “Hermanos Rossi”, da mesma cidade.

Com uma de suas formações, se apresentou no ciclo “Música por la Identidad”, que justamente organiza as Abuelas de Plaza de Mayo.

Não foi coincidência. Agora só falta o abraço.

 

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