Centro Psi: espaço dedicado à psicanálise

 

O Centro Psi vai reunir documentos que contem a história da psicanálise na Argentina, como cartas, fotos e anotações, livros, e funcionará na Biblioteca Nacional.

O espaço foi inaugurado ontem com palestra de  Elisabeth Roudinesco – aluna de  Lacan e de Deleuze, amiga de Althusser e Derrida.  A autora está na Argentina para lançar um livro que explica o inconsciente às crianças (El inconciente explicado a mi nieto), além de uma obra inédita: Diccionario amoroso del psicoanálisis.

psicanalise fotos Marina Zuccon

As fotos que ilustram este post são do projeto Interiorismo en Terapia, que a arquiteta Marina Zuccon fez para a revista Tyrannus

Na Argentina, a psicanálise está no linguajar das ruas, na televisão, nos jornais e, obviamente, nos divãs.  E agora, desde ontem, também numa sala especial da Biblioteca Nacional, no Centro Argentino de Historia del Psicoanálisis, la Psicología y la Psiquiatría, apelidado de “Centro Psi”. Convenhamos, o estoque de problemas do país dá para muitas sessões!

Durante a inauguração, o diretor do espaço deu dados surpreendentes: a Argentina tem mais psicólogos que dentistas, e 90% deles são de orientação psicanalítica. Ou seja, “é um dos poucos países onde a saúde mental é mais importante que a saúde bucal”, disse Alejandro Dagfal, que durante muitos anos esteve à frente da cadeira de História da Psicologia na Universidade de Buenos Aires.

A maioria dos profissionais é de orientação lacaniana. “Lacan está mais vivo na Argentina que na França”, acrescentou, lembrando ainda que até o Papa já fez análise. Semana passada, o Papa Francisco revelou que fez sessões semanais com uma psicanalista mulher e judia para “esclarecer algumas coisas”. Isso só podia acontecer com um Papa argentino.

Foto: arquiteta Marina Zuccon

Foto: arquiteta Marina Zuccon

A ideia do Centro é construir um arquivo que sirva de base para investigações bem fundamentadas. O lugar vai reunir documentos – públicos e privados – que contem a história “psi” do país, como cartas, fotos e anotações dos que levaram adiante esta disciplina na Argentina.

Também pretende adquirir  e conservar fontes documentais (orais, escritas e audiovisuais) em diferentes suportes, indispensáveis para a escritura desta história. O primeiro passo é fazer um levantamento bibliográfico do material já existente sobre o tema na Biblioteca Nacional, adquirir fontes bibliográficas primárias, secundárias e de referência, e a criação de um banco de teses de doutorado e uma hemeroteca especializada.

Entre o material novo que chegou estão a biblioteca e anotações de  Celes Cárcamo, um dos fundadores da Associação Psicoanalítica Argentina. Outro trabalho similar está sendo feito com a documentação de José Bleger, que cruzou a psicanálise com o marxismo.

Veja mais fotos dos consultórios de Buenos Aires 

 

Buenos Aires e a psicanálise

O livro já está a venda em Buenos Aires

Segundo dados da Universidade de Palermo, a Argentina tem um psicólogo para cada 650 habitantes. Em Buenos Aires a relação é de um para 120, mais que em Paris e Nova York! Aqui todo mundo é ou já foi psicoanalisado.

Na cidade há uma região chamada Villa Freud, que não faz parte da cartografia oficial, mas que todos sabem onde fica: “dentro” de Palermo, entre as ruas Medrano, Salguero, Mansilla e Charcas, onde estão estabelecidos cerca de mil consultórios. A maior concentração de psicólogos por metro quadrado – principalmente de orientação psicanalítica – de Buenos Aires.

A psicanálise se instalou no cotidiano dos portenhos, desde seu auge, nos anos 60. A população está familiarizada com palavras como “inconsciente, negación, proyección” e expressões como “sos una histérica” ou “estás somatizando” são bem comuns.

Ao longo dos anos, o discurso psi também chegou à mídia. O jornal Página 12 dedica duas páginas semanais à seção Psicologia, além de manter uma tira de Miguel Rep, cujo principal personagem é Gaspar, El Revolú, que está sempre no divã e é cotidianamente assaltado pelo polvo El Culpo.

Diz-se que esse entusiasmo pela psicanálise advém do fato de o portenho ser um italiano desterrado, que fala espanhol, se comporta como francês, mas que gostaria de ser inglês. E que, por isso, não é surpreendente que o país seja cheio de neuroses. Pode ser verdade, mas isso é papo para outra conversa.

Como dizem por aqui os terapeutas no final das sessões, “lo vemos en la próxima”…

 

Outros arquivos sobre a psicanálise na Argentina

Biblioteca de la Asociación Psicoanalítica Argentina

Archivo digital sobre Ángel Garma

Archivo sobre Gregorio Berman

 

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