“Notoriamente no hay clasificación del Universo que no sea arbitraria y conjetural. La razón es muy simple: no sabemos qué cosa es el universo”.
Jorge Luis Borges em El Idioma analítico de John Wilkins
Museu Rocsen: o Universo em Córdoba
Texto feito para o Clarín em português
Quem viaja a Nono, um povoado a 800 km de Buenos Aires, anda atrás de duas coisas: descanso e banho de rio. Os mais atentos, no entanto, vão reparar na plaquinha do Museu Polifacético Rocsen, escondida entre anúncios de pousadas, indicações de cachoeiras e trilhas, cervejarias, restaurantes.
Não dá outra. É preciso deixar o mergulho nas águas geladas para mais tarde e descobrir este espaço, um dos mais inusitados da região de Traslasierra, na província de Córdoba.
O estranhamento começa na fachada. São 49 estátuas de personalidades que representam a evolução do pensamento humano, de Buda a Martín Luther King.
O visitante é recebido na porta pelo criador e diretor do espaço, Juan Santiago Bouchon, um francês que adotou a Argentina na década de 1950, aos 23 anos. Recomendo fortemente um papo com ele. Bouchon faz o estilo Indiana Jones. A comparação é inevitável.
Não apenas porque ele fez sua primeira descoberta arqueológica aos oito anos em um anfiteatro romano – um pequeno soldado de barro de 2000 anos – mas também porque se veste como o arqueólogo do filme: calça e camisa bege, suspensórios da mesma cor, combinando com o rosto queimado de anos de sol. Falta só o chapéu!
Santiago conta que o Rocsen, espaço de 2.300 m2, reúne 47 mil objetos de diferentes naturezas e foi visitado por mais de 1 milhão de pessoas.
O acervo do Museu Rocsen tem desde uma múmia de Nazca, de 1.200 anos, até o primeiro livro de bolso feito no mundo, em 1546, em Veneza, passando por um cavalo tibetano de barro de 1000 anos e um vasto material inorgânico, que ultrapassa 2 mil peças.
Suas numerosas salas repassam a história do vestuário, da medicina, da imprensa, das guerras, da fotografia e da música, para citar alguns temas.
Mas o que impressiona mesmo é a enorme coleção de fósseis de todas a épocas e regiões do planeta (supera 400 peças), que se soma às salas do mar (com 500 moluscos), aos animais embalsamados (inclusive um tatu carreta, em vias de extinção), e às mais de mil borboletas e numerosas aves de diferentes partes do mundo.
“Sempre tive vocação para colecionista. Quando tinha três anos minha mãe costurava meus bolsos, porque os enchia com todas as coisas que me interessavam: pedras, insetos e raízes”.
Entre seus orgulhos estão os “rincões criollos”, que reproduzem como era a vida na Argentina entre 1825 e 1925, em diversos níveis socio-econômicos: a aristocracia em Buenos Aires e no campo, a burguesia na pequena e grande cidade, o agricultor independente, o peão de estância e a classe marginalizada.
Outro destaque do Museu Rocsen é a reprodução de uma oficina mecânica de grande porte, com cheiro de óleo e radinho de pilha sempre ligado. O Museu, aliás, também nunca desliga.
Funciona os 365 dias, a partir das 9h.
Museu Rocsen – Reconhecimento internacional
O Rocsen faz parte de uma cadeia de 17 mil museus e entre os catálogos internacionais é classificado como quatro estrelas. Um equivalente a “não deixe de visitar”. O nome significa “pedra santa” em celta e é polifacético por definição, para “chegar ao máximo de sensibilidades possíveis”, diz seu criador.
Santiago chegou à Argentina com três diplomas na mala: Antropologia, Belas Artes Superior e Artes Aplicadas a Industria, todos obtidos em Paris. Hoje, aos 85, tem “uma opinião formada sobre tudo”.
Fala rapidíssimo, frases feitas que repete há anos, desde que começou a construir este espaço, em 1969, sobre ecologia, guerras, política, história, generalidades. “Tudo é apaixonante, tudo é extraordinário. Há um milagre em cada milímetro cúbico do universo”.
Casado, seis filhos, oito netos, três bisnetos, Santiago tem também uma receita para a longevidade: “Discuto, escuto, sigo estudando e quando a coisa se complica, danço um pouco”. O futuro do museu também o mantém ativo. “Quero deixar tudo organizado. Afinal, estou mais para arpa do que para guitarra”, diz, comprovando que sua alma recebeu influências dos bem humorados cordobeses.